Alexandre Nuti quase trilhou a carreira esportiva. Na juventude fez parte do time de vôlei do clube Recreativa de Ribeirão Preto, da mesma geração que lançou Fernanda Venturini à seleção brasileira, sendo campeão dos jogos regionais e vice-campeão paulista. Era um ótimo levantador, mas a modesta altura de 1,72 cm indicava dificuldades para seguir nas quadras.
No vestibular, aos 17 anos, cogitou Medicina. Mas optou pelo Direito, ingressando na segunda turma do curso na Unesp de Franca em 1985. O pai, um químico e administrador de empresas que depois se tornaria advogado, foi decisivo na escolha.
“Medicina e Direito são próximos: ambos são vocacionados para cuidar de pessoas, e precisam conhecer o outro para buscar a solução. O paciente coloca a saúde na mão do médico, já o cliente deixa seu patrimônio e sua liberdade na mão do advogado”, explica Nutti sobre a dúvida no início da carreira.
Foi eleito em novembro de 2021, aos 54 anos, o novo presidente da 12ª Subseção da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que engloba quase 8,5 mil advogados de Ribeirão Preto e região. Obteve 1.627 apoiadores de um total de 4.798 votantes.
Antes disso, já havia recebido duas sondagens informais para se lançar presidente, mas repeliu de imediato: preferia primeiro conhecer a OAB. Por isso, se candidatou a tesoureiro nas chapas de 2015, que ficou em segundo lugar, e na vitoriosa de 2019.
“A OAB sempre tem que estar presente e vigilante”, afirmou ao Farolete, ao ser questionado sobre como será a atuação de sua gestão nas temáticas locais (leia entrevista completa abaixo).
Seu primeiro contato direto com a advocacia foi na faculdade, na Procuradoria de Assistência Judiciária da Unesp de Franca, onde participava de audiências. Recém-formado, partiu para um curso de Direito Internacional na Itália, que lhe rendeu em seguida um mochilão por seis meses percorrendo a maioria do continente europeu.
Usou a experiência na carreira, se especializando em Direito Internacional. Desde 2003 compartilha o conhecimento em sala de aula, atuando ininterruptamente há 18 anos como professor universitário, chegando inclusive a coordenador de cursos.
Confira, abaixo, os principais trechos da entrevista que concedeu ao Farolete:
A OAB tem um papel de relevância na sociedade, extrapolando causas diretamente ligadas ao exercício da advocacia. Na sua opinião, como a instituição deve atuar junto a temas de interesse coletivo?
A OAB tem estrutura federativa: nacional, estadual e subseções. É um paralelo ao presidente, governador e prefeito. Então, naturalmente, a OAB se envolve nas questões nacionais, estaduais e, no caso da nossa subseção, nas locais de Ribeirão Preto e região. Isso é uma questão que a OAB sempre tem que estar presente e vigilante. O advogado defende o cliente, mas no final de contas ele defende a sociedade. Está em nosso estatuto a função de zelar pelo Estado Democrático de Direito, respeito à Constituição, aperfeiçoamento das instituições jurídicas,… todo advogado promete isso no juramento. A OAB tem, entre aspas, essa função mais sindical, de investigar desvios éticos e zelar pelas prerrogativas, mas também a de defender a sociedade. Por isso temos garantido assento em conselhos municipais, por exemplo. Mas a nossa gestão não vai entrar no aspecto da política partidária.
Dependendo da gestão, a subseção da OAB se envolve mais ou menos nas causas locais. Já tivemos presidência da entidade na linha de frente para reduzir o número de vereadores da Câmara, por exemplo. Como será o seu mandato?
Sobre a atuação mais ou menos ativa: quando o tema é de relevância, a OAB tem que aparecer mesmo. Mas não pode aparecer toda vez, toda hora. Senão perde a contundência de sua chegada no tema. A OAB não é o Fox Paulistinha lá na frente, é o rottweiler que está atrás. Não fica latindo à toa: quando chegamos, tem que ser para resolver. Na nossa campanha, inclusive, tivemos uma proposta, vinda do colega Sérgio Roxo, de todos os temas de relevância serem debatidos dentro da OAB. Por exemplo: ano que vem haverá eleição, iremos debater presidencialismo, sistema distrital…
Aproveitando, como o senhor vê a OAB, inclusive a subseção, atuando nesse cenário eleitoral do próximo ano?
A OAB, como instituição de estado, não deve nem aprovar nem desaprovar a candidaturas de maneira personalizada. O que ela deve fazer é acompanhar o processo eleitoral para que seja todo legítimo, que não haja dúvida de que os eleitos receberam mandato da população, e que tanto durante a campanha, quanto no exercício do mandato, não haja descumprimento de nossos princípios constitucionais. A OAB vai participar do processo eleitoral, mas dentro de nossas previsões estatutárias. Claro que eu, como presidente, tenho as minhas convicções partidárias, os diretores também, mas não podemos mais externá-las publicamente porque acaba indo o peso da instituição junto. Uma de nossas bandeiras é, justamente, política partidária fora da OAB.
Você citou o Centro Permanente de Estudos. Haverá alguma atuação voltada para o combate à desinformação, em especial o que convencionou-se chamar de fake news? Essa foi, inclusive, a tonificação da eleição de 2018. Como vê esse contexto, que atinge a todos, inclusive advogados?
A comunidade jurídica cai menos na desinformação, em razão do senso crítico natural da profissão. Mas a desinformação mina toda a sociedade por dentro, ainda mais se resultar na eleição de pessoas que talvez não seriam eleitas se a informação chegasse completamente. Isso é muito ruim. A disseminação da informação de qualidade é determinante nesse sentido, e por isso a OAB tem que estar à disposição da sociedade para dar conhecimento técnico, mas sem tecnicismo.
Diversos institutos alertam para retrocessos democráticos no país, em especial nos últimos três anos, de forma escalonada, com destaque para práticas do Governo Federal. Qual a sua opinião sobre esse tema? Há algum receio pessoal? A OAB de Ribeirão Preto terá alguma atuação nesse contexto?
A democracia no Brasil está sempre em constante ataque, com mais ou menos intensidade. A questão é que as falas dos mandatários podem ser muito incendiárias. Em todos esses ataques recentes a sociedade conseguiu conter, com atuação determinante das instituições. Havia, é claro, riscos. Muitas pessoas imaginavam que seria declarado o estado de sítio, o Supremo Tribunal Federal seria invadido… O que a OAB tem que fazer é cumprir seu estatuto: juramos defender a Constituição e o Estado Democrático de Direito, com a democracia plena, em que impera a lei, e não a vontade individual de um grupelho para transformar a lei ao seu sabor. Então ficaremos muito atentos, principalmente no ano que vem. Não haverá coloração política: fez algo que, mediante debate, entendermos que afronta a constituição, vamos nos posicionar, coletar o depoimento de colegas da Alta Mogiana e enviar para a seccional e o Conselho Federal.
Não o presidente da OAB, mas o cidadão Nuti está preocupado com os rumos democráticos do país?
Agora estou um pouco mais tranquilo, mas já fiquei bem mais preocupado. Os arroubos de outrora já perderam a força. Mas sempre é bom lembrar que quem ataca uma vez, ataca duas vezes. Não se consegue tirar o instinto da pessoa.
Qual o seu livro de cabeceira?
Um é o Lições Preliminares de Direito, do Miguel Reale. É um livro do primeiro ano, mas quem ler verá o sistema jurídico inteiro funcionando. Eu sempre busco mudar meu estilo de leitura, pois se ficar lendo apenas Direito serei um péssimo advogado. Atualmente estou lendo três volumes do Mitologia Grega (Junito de Souza Brandão). Mas gosto de psicanálise, história, e naturalmente filosofia.
Para encerrar: qual a linha ideológica do cidadão Nuti? Mais à esquerda, à direita…?
Claro que eu tenho uma linha ideológica, todo mundo tem. Mas a partir do momento em que se assume a OAB, qualquer posição político-ideológica que você externa é usada contra você e a instituição. A partir do momento em que se é presidente eleito, não posso mais me posicionar publicamente nessa linha. Mas eu sou um democrata, que sigo o meu juramento de defender a justiça social.
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Das 5.570 cidades brasileiras, apenas três não possuem um Plano Municipal de Educação (PME): Ribeirão Preto, Iaras e Vargem, todas paulistas. Sem o documento aprovado na forma de lei, algo obrigatório desde 2016, esses municípios são barrados para recursos milionários do Ministério da Educação (MEC).
O PME planeja as políticas públicas municipais para o ensino pelos próximos dez anos, estipulando gastos, indicadores, metas e ações. Ele é uma exigência do Plano Nacional de Educação, que vigora no país desde 2014.
Ribeirão Preto foi vanguarda ao iniciar suas discussões em 2007, mas as gestões Dárcy Vera (2009-2016) e Duarte Nogueira (2017-atual) foram incapazes de chegar a um consenso entre Executivo, Legislativo e sociedade. Assim, um PNE nunca chegou a ser transformado em lei, algo que outras 5.567 prefeituras tiveram êxito.
“Além de ser dever legal desde 2016, o PME é fundamental para dar um norte que vá além da visão imediatista do secretário ou prefeito de plantão. Sem planejamento de longo prazo, não há qualidade de gestão”, resume José Marcelino de Rezende Pinto, professor da USP-RP e ex-presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (leia entrevista no final da reportagem).
Por não ter PME, Ribeirão Preto está proibido de pleitear recursos do PAR (Plano de Ações Articuladas), um programa do MEC para financiar, com verbas suplementares, ações de melhoria na educação. A informação foi confirmada ao Farolete pelo Governo Federal, por meio da Lei de Acesso à Informação.
No ano passado, o MEC repassou R$ 760 milhões para municípios brasileiros que cadastraram projetos no âmbito do PAR, sendo 60 do estado de São Paulo. A capital paulista recebeu R$ 3,5 milhões.
A minúscula Ubirajara, com menos de 5 mil habitantes, ficou com R$ 642 mil.
Os dados foram analisados pelo Farolete na plataforma de execução orçamentária do MEC. O Governo Federal informou, em resposta à Lei de Acesso, não ser possível estipular quanto Ribeirão Preto já deixou de receber, pois as verbas são definidas de acordo com os projetos cadastrados.
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