Mesmo longe do topo, rede estadual de RP tem salto no Saresp e vira exemplo com parcerias para formação
Cidade teve o maior avanço na pontuação em Português e Matemática do 9º ano entre as dez cidades mais populosas do estado
A rede estadual de ensino em Ribeirão Preto ainda está longe de apresentar as melhores notas do Saresp (Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo) no Ensino Fundamental. Entretanto, se destacou no ano passado com um expressivo salto no aprendizado dos estudantes.
Para esta reportagem, Farolete considerou a rede estadual em cada cidade, e não o consolidado por diretoria de ensino (que abrange vários municípios). As análises foram realizadas a partir dos microdados do governo estadual, com metodologia própria (detalhada ao final).
Ribeirão Preto teve o maior avanço na média de aprendizado em Língua Portuguesa e em Matemática do 9º ano do Fundamental entre as dez cidades mais populosas de São Paulo.
Em Língua Portuguesa, a média de pontuação dos alunos ribeirão-pretanos no 9º ano pulou da 395º colocação em 2022 para o 318º lugar em 2024 entre as 507 cidades do estado com rede estadual nos Anos Finais. Em matemática, a cidade ocupou a 284ª colocação na última avaliação, ganhando 97 posições em relação a 2023. Apesar da melhora expressiva, a cidade ocupa apenas a posição intermediária no ranking estadual.
“Temos crescido gradativamente, pouco a pouco, com muita coesão e coerência”, diz Marcela Aleixo, dirigente regional de ensino de Ribeirão Preto.
Marcela elenca como pilares do crescimento uma política de monitoramento de indicadores e uma parceria iniciada em 2022 com a Fundação Educandário, organização social sem fins lucrativos, para a formação do corpo administrativo e pedagógico das escolas (leia mais abaixo).
Das 41 escolas da rede estadual em Ribeirão com notas divulgadas para o 9º ano nas duas últimas edições do Saresp, 26 melhoraram o desempenho em Português. A maior evolução foi da Paulo Cesar Carniel Giovannetti, no Jardim Paiva II, com um salto de 20% na média, se tornando a melhor nota ribeirão-pretana e a 42ª no ranking de 3.648 unidades do estado nesta disciplina.
Em Matemática, o destaque ficou com escola Profª Nair Guilhermina Pinheiro Nogueira. Localizada no Jardim Aeroporto, um dos bairros mais vulneráveis da cidade, registrou um salto de 31% na nota média em apenas um ano, tornando-se a segunda melhor unidade da rede na cidade nessa disciplina.
Os Anos Iniciais também registraram evolução. No 5º ano, a cidade saiu do 83º para o 68º lugar entre 2022 e 2024 em Língua Portuguesa entre 103 cidades. O universo nos Anos Iniciais do Fundamental é menor do que nos Anos Finais, pois na maioria dos municípios apenas a prefeitura fornece essa etapa.
Comparativo com a prefeitura
Os resultados positivos da rede estadual ribeirão-pretana no Saresp 2024 contrastam com os da prefeitura. Conforme Farolete mostrou em março, a rede municipal estagnou na lanterna do aprendizado nos Anos Iniciais. Não há dados disponíveis dos Anos Finais da prefeitura que permitam realizar uma análise comparativa.
Formação como pilar
Marcelo Aleixo, dirigente da Diretoria Regional de Ensino de Ribeirão Preto, credita o avanço a dois fatores: monitoramento e formação. Uma parceria iniciada em 2022 com a Fundação Educandário, instituição sem fins lucrativos sediada em Ribeirão Preto dedicada à democratização do acesso à educação de qualidade, se tornou um divisor de águas.
A Fundação Educandário é a mantenedora da Biblioteca Sinhá Junqueira, responsável pelo Colégio Camillo de Matos (destinado a crianças de baixa renda e detentor do melhor Saresp da cidade, conforme Farolete mostrou em 2023) e gerencia uma unidade de ensino infantil por contrato de gestão com a prefeitura ribeirão-pretana.
A parceria para formação inicialmente começou com diretores. Depois, foi ampliada para coordenadores pedagógicos, vice-diretores e professores.
Mais de mil pessoas de 102 escolas já participaram dos cursos de formação, que são promovidos gratuitamente – tanto para os profissionais quanto para o governo estadual – pela Fundação com recursos próprios ou de doações.
Todas as escola da diretoria de ensino participam do programa, e não apenas as sediadas em Ribeirão Preto. Cada encontro chega a levar oito horas, e é personalizado para as demandas do público-alvo.
“Essa parceria com o Educandário se tornou essencial para a rede. Definimos em conjunto quais são as necessidades prioritárias. O diretor da escola, por exemplo, não pode atuar apenas no administrativo e disciplinar e esquecer do pedagógico. Por isso, um dos temas de uma formação foi a gestão de tempo, capacitando o diretor a construir uma agenda eficiente para priorizar as necessidades da escola e saber delegar”, explica Marcela.
Fabiano Gonçalves, Diretor Executivo da Fundação Educandário, reforça que a atuação é construída horizontalmente com a dirigente, a Secretaria Estadual de Educação e os profissionais.
“Nunca chegamos com soluções prontas e não nos colocamos como salvadores da pátria. Nossa atuação na rede estadual buscou fortalecer um trabalho forte que já estava em andamento. Remamos todos para o mesmo lado, e temos colhido mudanças muito positivas”
Fabiano Gonçalves
Fabiano diz que em 2023 o tema transversal da formação foi a recuperação dos alunos que estavam fora da escola. “Então trabalhamos com engajamento. Depois, verificamos que a diretoria de ensino de Ribeirão foi a que mais cresceu no indicador de estudantes presentes em sala de aula”.
Para Marcela, o outro pilar dos bons resultados é uma política de monitoramento. “Entendemos cada escola como única, com especificidades próprias. Verificamos a frequência dos alunos para entendermos o que tem motivado as desistências e atuamos para retomar o engajamento, com desde conversa com os pais até abordagens diversas no conteúdo. Em 2023, tínhamos uma média de 75% dos alunos em sala de aula. Este ano já estamos com 82%“, afirma.
Ela diz que a diretoria regional passou a acompanhar, presencialmente, as aulas dos professores. “Não no sentido de fiscalizar o professor, mas sim de auxiliar, identificando eventuais problemas ou potencial para melhorias em sua atuação”, detalha Marcela.
Prefeitura
Fabiano aponta que a Fundação Educandário ofereceu “algumas vezes” apoio para a secretaria municipal de educação de Ribeirão na gestão Duarte Nogueira, mas que o governo local não concretizou uma parceria.
Ele diz que está em diálogo com a gestão Ricardo Silva para a implementação de um projeto similar ao realizado com o governo estadual.
Como fizemos essa reportagem
Realizamos o download dos microdados das edições de 2022, 2023 e 2024 do Saresp. Cada linha do arquivo representa o desempenho de um estudante, tanto da rede municipal quanto estadual.
Consideramos nos cálculos apenas estudantes com nota válida, ou seja: que é computada para as médias oficiais. Não entram na conta, por exemplo, alunos com necessidades especiais. Essa classificação consta do Dicionário de Dados do Saresp.
Foram consideradas apenas as avaliações com nota diferente de zero ou nulo.
Das 5.570 cidades brasileiras, apenas três não possuem um Plano Municipal de Educação (PME): Ribeirão Preto, Iaras e Vargem, todas paulistas. Sem o documento aprovado na forma de lei, algo obrigatório desde 2016, esses municípios são barrados para recursos milionários do Ministério da Educação (MEC).
O PME planeja as políticas públicas municipais para o ensino pelos próximos dez anos, estipulando gastos, indicadores, metas e ações. Ele é uma exigência do Plano Nacional de Educação, que vigora no país desde 2014.
Ribeirão Preto foi vanguarda ao iniciar suas discussões em 2007, mas as gestões Dárcy Vera (2009-2016) e Duarte Nogueira (2017-atual) foram incapazes de chegar a um consenso entre Executivo, Legislativo e sociedade. Assim, um PNE nunca chegou a ser transformado em lei, algo que outras 5.567 prefeituras tiveram êxito.
“Além de ser dever legal desde 2016, o PME é fundamental para dar um norte que vá além da visão imediatista do secretário ou prefeito de plantão. Sem planejamento de longo prazo, não há qualidade de gestão”, resume José Marcelino de Rezende Pinto, professor da USP-RP e ex-presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (leia entrevista no final da reportagem).
Barrado
Por não ter PME, Ribeirão Preto está proibido de pleitear recursos do PAR (Plano de Ações Articuladas), um programa do MEC para financiar, com verbas suplementares, ações de melhoria na educação. A informação foi confirmada ao Farolete pelo Governo Federal, por meio da Lei de Acesso à Informação.
No ano passado, o MEC repassou R$ 760 milhões para municípios brasileiros que cadastraram projetos no âmbito do PAR, sendo 60 do estado de São Paulo. A capital paulista recebeu R$ 3,5 milhões.
A minúscula Ubirajara, com menos de 5 mil habitantes, ficou com R$ 642 mil.
Os dados foram analisados pelo Farolete na plataforma de execução orçamentária do MEC. O Governo Federal informou, em resposta à Lei de Acesso, não ser possível estipular quanto Ribeirão Preto já deixou de receber, pois as verbas são definidas de acordo com os projetos cadastrados.
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