Vereadores fazem confusão e citam segurança pública para justificar aumento salarial
Câmara de Ribeirão se amparou em um parecer de quatro parágrafos, sem estudos e com citação indevida a um convênio
A Câmara de Ribeirão Preto se amparou em um parecer de quatro parágrafos, sem estudos e com citação indevida a um convênio de segurança pública para aumentar em 49% os subsídios dos vereadores, do prefeito, vice-prefeito e secretários.
Em 23/2, no mesmo dia em que o aumento foi votado, três vereadores da Comissão de Orçamento e Finanças emitiram um parecer – que é obrigatório em matérias envolvendo subsídios – defendendo os novos subsídios.
Esse documento não traz nenhuma conta do impacto financeiro do projeto.
Mas, em contrapartida, cita que “o cumprimento da presente medida não trará custo por tratar de verba de convênio com a Secretaria de Segurança Pública”.
Os vereadores Sérgio Zerbinato, Maurício Vila Abranches e André Trindade assinaram o parecer de uma única folha sem perceber que o costumeiro “copia e cola” estava errado.
Mesmo assim, esse documento embasou a aprovação do aumento de 49% dos subsídios pouco depois. O projeto teve o aval de 19 vereadores. Dois estavam de licença saúde e apenas Ramon Faustino (PSOL) votou contra.
A aprovação foi relâmpago: apenas sete dias de tramitação, cinco deles tomados pelo Carnaval.
Impacto
A Câmara fez contas de padaria. A justificativa do projeto apontava impacto anual de R$ 1,3 milhão no Executivo com reajuste no subsídio. Conforme Farolete revelou, o Legislativo esqueceu de considerar o efeito cascata do novo teto do funcionalismo.
As contas do Farolete apontam um impacto de pelo menos R$ 27,6 milhões ao ano. Refere-se a R$ 9,4 milhões da prefeitura (130 funcionários no teto) e R$ 18,2 milhões do IPM (269 inativos).
Ministério Público
Sete entidades da sociedade civil protocolaram ontem no Ministério Público uma representação apontando possíveis irregularidades cometidas pela Câmara na aprovação do subsídios. Elas citam os cálculos do Farolete, justificando a ausência de estudos do Legislativo.
Hoje, o promotor Sebastião Sérgio da Silveira instaurou um inquérito para apurar o caso. Ele deu dez dias para o presidente da Câmara, vereador Franco Ferro, prestar esclarecimentos sobre seis pontos.
O MP requisitou, entre outros, os estudos adotados pela Câmara para saber se “as despesas previstas com a possível execução do projeto de lei se enquadram dentro dos limites impostos pela Constituição Federal”.
O movimento foi encabeçado pela Acirp (Associação Comercial e Industrial de Ribeirão Preto), apoiado pelo Sincovarp (Sindicato do Comércio Varejista de Ribeirão Preto ), Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL), Associação das Empresas Incorporadoras, Loteadoras e Construtoras de Ribeirão Preto (Assilcon), Sindicato de Hotéis, Bares, Restaurantes e Similares de Ribeirão Preto (SHRBS), Associação das Empresas de Serviços Contábeis de Ribeirão Preto (Aescon) e Movimento Brasil Livre Ribeirão Preto (MBL-RP).
Outro lado
Vereadores apontam que: o projeto seguiu os trâmites legais; é prerrogativa da Câmara deliberar sobre subsídios; não se trata de aumento, e sim de recomposição inflacionária, já que o último reajuste ocorreu em 2017.
Desde então, a classe política e o funcionalismo barrado pelo teto, hoje em R$ 23 mil, não tiveram mudanças nos valores.
Assessoria do vereador Zerbinato, presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, informou ao Farolete que ele não se manifestaria sobre o parecer errado.
Das 5.570 cidades brasileiras, apenas três não possuem um Plano Municipal de Educação (PME): Ribeirão Preto, Iaras e Vargem, todas paulistas. Sem o documento aprovado na forma de lei, algo obrigatório desde 2016, esses municípios são barrados para recursos milionários do Ministério da Educação (MEC).
O PME planeja as políticas públicas municipais para o ensino pelos próximos dez anos, estipulando gastos, indicadores, metas e ações. Ele é uma exigência do Plano Nacional de Educação, que vigora no país desde 2014.
Ribeirão Preto foi vanguarda ao iniciar suas discussões em 2007, mas as gestões Dárcy Vera (2009-2016) e Duarte Nogueira (2017-atual) foram incapazes de chegar a um consenso entre Executivo, Legislativo e sociedade. Assim, um PNE nunca chegou a ser transformado em lei, algo que outras 5.567 prefeituras tiveram êxito.
“Além de ser dever legal desde 2016, o PME é fundamental para dar um norte que vá além da visão imediatista do secretário ou prefeito de plantão. Sem planejamento de longo prazo, não há qualidade de gestão”, resume José Marcelino de Rezende Pinto, professor da USP-RP e ex-presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (leia entrevista no final da reportagem).
Barrado
Por não ter PME, Ribeirão Preto está proibido de pleitear recursos do PAR (Plano de Ações Articuladas), um programa do MEC para financiar, com verbas suplementares, ações de melhoria na educação. A informação foi confirmada ao Farolete pelo Governo Federal, por meio da Lei de Acesso à Informação.
No ano passado, o MEC repassou R$ 760 milhões para municípios brasileiros que cadastraram projetos no âmbito do PAR, sendo 60 do estado de São Paulo. A capital paulista recebeu R$ 3,5 milhões.
A minúscula Ubirajara, com menos de 5 mil habitantes, ficou com R$ 642 mil.
Os dados foram analisados pelo Farolete na plataforma de execução orçamentária do MEC. O Governo Federal informou, em resposta à Lei de Acesso, não ser possível estipular quanto Ribeirão Preto já deixou de receber, pois as verbas são definidas de acordo com os projetos cadastrados.
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Indignação
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