Ensino da prefeitura de Ribeirão fica entre os piores de São Paulo no Saresp 2023
Um em cada quatro alunos do 5º ano teve aprendizado insuficiente em português, 30% não sabem matemática
A rede municipal de ensino de Ribeirão Preto ficou na parte de baixo do ranking de aprendizado das prefeituras no Saresp (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo) aplicado em 2023. Os resultados acendem mais um sinal de alerta no município, que coleciona resultados ruins na educação nos últimos anos.
Das 625 prefeituras paulistas que participaram do Saresp 2023 e tiveram dados divulgados, Ribeirão Preto foi a 558º no desempenho em Língua Portuguesa e 551º em Matemática.
O levantamento foi feito pelo Farolete a partir dos microdados da avaliação. Todas as informações desta reportagem se referem à pontuação dos alunos do 5º ano do Ensino Fundamental das redes municipais (veja a metodologia ao final).
Entre as 77 cidades paulistas com mais de 100 mil habitantes, Ribeirão teve o quarto pior desempenho em Língua Portuguesa (74º) e o nono (69º) em Matemática.
O Saresp divulga a pontuação de cada estudante, de forma anonimizada, e se o seu resultado foi considerado “insuficiente”, “adequado” ou “avançado”, segundo as métricas oficiais do governo estadual.
Dos 2,1 mil alunos do 5º ano da prefeitura de Ribeirão Preto que prestaram a prova e tiveram notas válidas, 24% foram classificados como aprendizado insuficiente em português e 30% em matemática, conforme levantamento do Farolete. Os resultados contrastam com o grupo de cidades do mesmo porte.
No comparativo com todas as prefeituras paulistas que prestaram a prova, Ribeirão também registrou desempenho bem inferior à média em ambas as disciplinas.
Maior fatia no imposto
O Saresp é uma avaliação aplicada pelo governo de São Paulo desde 1996 para monitorar o desempenho das escolas públicas, avaliando os Anos Iniciais (1º ao 5º ano) e Anos Finais (6º ao 9º ano) do Ensino Fundamental e Ensino Médio. Tradicionalmente, apenas as escolas da rede estadual participavam.
Em 2022 foi sancionada uma lei estadual que criou o ICMS da Educação. A partir de 2025, as prefeituras com melhores resultados no Saresp passarão a receber uma fatia maior da repartição do imposto.
Com isso, mais prefeituras estão aderindo à prova: em 2022 foram 354 redes municipais avaliadas, montante que saltou para 625 em 2023.
Melhora insuficiente
A prefeitura de Ribeirão Preto melhorou seus resultados em 2023 no comparativo com o ano anterior.
Entretanto, os resultados aferidos em 2022 foram tão ruins que a melhora verificada em 2023 foi insuficiente para retirar a cidade do grupo de piores desempenhos das redes municipais.
Em razão da baixa participação das prefeituras em 2022, o comparativo da evolução de Ribeirão Preto com os demais municípios fica prejudicado.
Considerando apenas as 354 prefeituras que prestaram a prova em 2022 e em 2023, a evolução da nota média de ribeirão-preto (comparação da pontuação nos dois anos) foi apenas a 94º em Língua Portuguesa e 150º em Matemática no ranking desse grupo.
A melhora de Ribeirão Preto em 2023, portanto, não representa um grande diferencial em relação às demais prefeituras que prestaram a prova no ano anterior.
Especialistas
“Os resultados da pesquisa do Farolete, considerando o percentual de alunos com aprendizado suficiente e avançado, mostram que a rede municipal de Ribeirão Preto ficou para trás”.
Quem afirma é Mozart Neves Ramos, um dos mais respeitados pesquisadores em educação do país, com vasta trajetória – incluindo a coordenação de uma cátedra do IEA (Instituto de Estudos Avançados) da USP de Ribeirão Preto dedicada ao tema.
Segundo Mozart, a prefeitura de Ribeirão Preto teve resultados “pífios” no Saresp e no Saeb (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica), prova nacional que resulta no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica).
Apesar do esforço da secretaria municipal de educação para melhorar a infraestrutura das escolas, isto não chegou na ponta do ponto de vista da aprendizagem escolar”
Mozart NevesA gestão Duarte Nogueira faz propaganda das reformas em prédios escolares, da regularização do AVCB (Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros) das unidades e da instalação de aparelhos de ar-condicionada – embora com atrasos e erros, conforme Farolete revelou.
“Os próximos anos vão exigir muita atenção do gestor municipal no campo na melhoria da aprendizagem escolar, tanto em língua portuguesa como em matemática”, alerta Mozart.
Fabiano Gonçalves, Diretor Executivo na Fundação Educandário Cel. Quito Junqueira e com duas décadas de atuação em projetos educacionais, afirma que quando os resultados “não acompanham a média de municípios de mesmo porte, é fundamental investigar as causas, que certamente não vêm do trabalho realizado em apenas um ano”.
Ele diz que a melhora da prefeitura de Ribeirão Preto no Saresp 2023, na comparação com o ano anterior, “é um sinal positivo, mas não deve ser motivo para comemorações excessivas”.
Ressaltando que “a educação é um processo contínuo e os avanços devem ser vistos como parte de um esforço maior e mais longo”, Fabiano aponta que “é importante manter a perspectiva sobre a qualidade geral do ensino e as metas a serem alcançadas, consolidando as melhorias e garantindo que elas se sustentem ao longo do tempo”.
O que diz prefeitura
Questionada pelo Farolete, a prefeitura de Ribeirão Preto afirmou que “todos os níveis de proficiência evoluíram positivamente” no Saresp 2023, quando comparados aos do ano anterior.
“Essa foi apenas a segunda vez que as escolas da rede municipal participaram do Saresp, o que demonstra o interesse desta gestão em reconhecer a atual situação da aprendizagem, a fim de promover as transformações tão necessárias e aguardadas”, informa a nota.
O governo pontua, também, que “se trata de uma avaliação com matrizes e currículo diferentes da rede municipal, e os resultados não podem ser simplesmente comparados quantitativamente”.
A prefeitura voltou a ressaltar que “a rede municipal de ensino de Ribeirão Preto permaneceu por 18 meses sem aulas presenciais durante a pandemia da COVID-19, após uma Ação Civil Coletiva movida pelo Sindicato dos Servidores Municipais”, alegando que “a pausa criou uma lacuna que outros municípios não enfrentaram, dificultando uma comparação justa com outras redes para nossos estudantes”.
O Sindicato, por sua vez, reiteradamente rebate afirmando que o governo demorou para tomar medidas de adequação sanitária nas escolas.
Mais um resultado ruim
O Saresp 2023 é mais um da série de resultados ruins colecionados pela rede municipal de ensino de Ribeirão Preto desde 2019. Naquele ano, o Ideb apresentou queda em comparação com 2017.
Dois anos depois, já sob os efeitos da Covid-19, a prefeitura registrou o terceiro maior retrocesso nos Anos Iniciais entre as 115 cidades brasileiras mais populosas, conforme revelado pelo Farolete.
No Saresp 2022, metade dos alunos dos Anos Finais (9º ano do Ensino Fundamental) não sabiam matemática.
Farolete produzirá outras reportagens com outros recortes sobre o Saresp 2023.
Como fizemos essa reportagem
Realizamos o download dos microdados das edições de 2023 e 2022 do Saresp. Cada linha do arquivo representa o desempenho de um estudante, tanto da rede municipal quanto estadual.
Usando linguagem SQL, filtramos apenas os estudantes das redes municipais (excluindo os da rede estadual) e do 5º ano do Ensino Fundamental.
Consideramos, nos cálculos, apenas estudantes com nota válida, ou seja: que é computada para as médias oficiais. Não entram na conta, por exemplo, alunos com necessidades especiais. Essa classificação consta do Dicionário de Dados do Saresp.
Nas análises, foram consideradas apenas as avaliações com nota diferente de zero ou nulo.
Das 5.570 cidades brasileiras, apenas três não possuem um Plano Municipal de Educação (PME): Ribeirão Preto, Iaras e Vargem, todas paulistas. Sem o documento aprovado na forma de lei, algo obrigatório desde 2016, esses municípios são barrados para recursos milionários do Ministério da Educação (MEC).
O PME planeja as políticas públicas municipais para o ensino pelos próximos dez anos, estipulando gastos, indicadores, metas e ações. Ele é uma exigência do Plano Nacional de Educação, que vigora no país desde 2014.
Ribeirão Preto foi vanguarda ao iniciar suas discussões em 2007, mas as gestões Dárcy Vera (2009-2016) e Duarte Nogueira (2017-atual) foram incapazes de chegar a um consenso entre Executivo, Legislativo e sociedade. Assim, um PNE nunca chegou a ser transformado em lei, algo que outras 5.567 prefeituras tiveram êxito.
“Além de ser dever legal desde 2016, o PME é fundamental para dar um norte que vá além da visão imediatista do secretário ou prefeito de plantão. Sem planejamento de longo prazo, não há qualidade de gestão”, resume José Marcelino de Rezende Pinto, professor da USP-RP e ex-presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (leia entrevista no final da reportagem).
Barrado
Por não ter PME, Ribeirão Preto está proibido de pleitear recursos do PAR (Plano de Ações Articuladas), um programa do MEC para financiar, com verbas suplementares, ações de melhoria na educação. A informação foi confirmada ao Farolete pelo Governo Federal, por meio da Lei de Acesso à Informação.
No ano passado, o MEC repassou R$ 760 milhões para municípios brasileiros que cadastraram projetos no âmbito do PAR, sendo 60 do estado de São Paulo. A capital paulista recebeu R$ 3,5 milhões.
A minúscula Ubirajara, com menos de 5 mil habitantes, ficou com R$ 642 mil.
Os dados foram analisados pelo Farolete na plataforma de execução orçamentária do MEC. O Governo Federal informou, em resposta à Lei de Acesso, não ser possível estipular quanto Ribeirão Preto já deixou de receber, pois as verbas são definidas de acordo com os projetos cadastrados.
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