Farolete analisou os dados oficiais do primeiro quadrimestre de cada ano cadastrados no Tribunal de Contas
A prefeitura de Ribeirão Preto aportou no início de 2022 o menor volume de recursos para Educação desde 2015, considerando o acumulado de janeiro a abril de cada ano.
O primeiro quadrimestre de 2022 foi inferior aos anteriores tanto no comparativo do quantitativo de gastos, corrigidos pela inflação, quanto no percentual de despesas com ensino em relação ao arrecadado pelo município.
A análise foi feita pelo Farolete nos dados oficiais cadastrados pela prefeitura no Tribunal de Contas do Estado (TCE). A queda de recursos para educação em 2022 contrasta com a necessidade de recuperar a defasagem no aprendizado causada pela pandemia de Covid-19.
Para efeito de comparação, em 2022 a prefeitura investiu R$ 150,5 milhões de recursos próprios em educação até abril. Em 2020, no mesmo período, foram R$ 162,1 milhões (R$ 194 milhões com correção inflacionária).
Em nota ao Farolete, a prefeitura alegou “sazonalidade” de arrecadação e despesas, apontou diferenças contábeis e garantiu que ampliará os investimentos em 2022 (leia mais abaixo).
Todo município é obrigado a direcionar 25% de suas receitas para educação. A proporção não precisa se manter em todos os meses. Como no início do ano o governo arrecada mais, em razão de impostos como IPTU, o percentual no ensino acaba ficando menor. Depois, com redução de receitas e aumento das despesas, como 13º salário, o nível aumenta.
No primeiro quadrimestre de 2022, o percentual de investimento em educação de Ribeirão ficou em 16,11%. Esse é o menor patamar dos últimos sete anos, considerando dados até abril de cada exercício. É inferior, inclusive, ao nível de 2021.
No ano passado, conforme Farolete mostrou, Ribeirão Preto não conseguiu atingir o mínimo constitucional obrigatório de 25% com educação até dezembro. A prefeitura culpou a Covid-19 pelo descumprimento legal.
O TCE não atualizou, até a publicação desta reportagem, os dados referentes a maio de 2022. Por isso, os comparativos do Farolete consideraram apenas o primeiro quadrimestre de cada ano.
Professor da USP-RP e ex-presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação, José Marcelino diz que a prefeitura de Ribeirão Preto descumpre os pressupostos da LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).
Segundo ele, a legislação aponta que os municípios devem corrigir seu planejamento a cada três meses, de modo a alcançarem o percentual mínimo obrigatório de gastos com Educação.
A prefeitura está na ilegalidade. Mostra falta de planejamento ante uma regra que está definida desde 1996. Em educação a sensação é que não se aprende nada com a experiência do ano anterior. Ou é incompetência, ou desleixo.
José MarcelinoSegundo Marcelino, “sabendo que as receitas são maiores neste início e considerando as férias, seria o momento ideal para as reformas escolares”, apontando que os prédios poderiam ser adequados, inclusive, para a pandemia de Covid-19, com medidas de higiene e circulação do ar.
Em nota ao Farolete, a prefeitura justificou que as mudanças no percentual de aplicação em Educação ocorrem “devido à sazonalidade das arrecadações e da execução das despesas”, citando a ampliação das receitas em razão da inflação, “o que acarreta na dificuldade de prever o montante total de recursos disponíveis no período”.
O governo apontou que no final do ano há aumento de gastos, em razão do 13º salário e férias dos profissionais, e por isso faz um “provisionamento dos recursos para suprir a despesa ao longo de todo o exercício, o que muitas vezes inviabiliza que o percentual dos 25% seja atingido bimestralmente”.
Sobre não ter alcançado o mínimo constitucional em 2021, aplicando apenas 23,45% da receita, a Educação informou que os recursos não utilizados foram reservados em uma conta separada, para aplicação ao longo do ano. Ressaltou, ainda, que a situação ocorreu em razão da Covid-19.
A pasta também apontou ser necessário analisar o contexto de cada ano. Alegou, por exemplo, que em 2020 o governo antecipou o 13º salário aos servidores para abril, por isso o valor nominal do primeiro quadrimestre daquele ano foi maior do que em 2022.
E que, ainda, despesas relacionadas a salários e encargos, custeadas com recursos do Fundeb em 2022, foram computadas no exercício de 2021, reduzindo o montante acumulado no primeiro quadrimestre deste ano.
“A Secretaria Municipal da Educação vem realizando um aumento nas despesas da pasta, aplicando de forma eficiente todos os recursos disponíveis no exercício, tendo como objetivo primário a qualidade do ensino disponível”, afirmou a pasta, em nota.
Segundo o governo, “em 2022 foram contratados mais docentes”, entre eles “385 profissionais para o projeto Todos Juntos, que é a inclusão do segundo professor nas escolas do 1º ao 4º ano do Ensino Fundamental”.
Farolete produzirá nova reportagem quando os dados do segundo quadrimestre forem consolidados.
Das 5.570 cidades brasileiras, apenas três não possuem um Plano Municipal de Educação (PME): Ribeirão Preto, Iaras e Vargem, todas paulistas. Sem o documento aprovado na forma de lei, algo obrigatório desde 2016, esses municípios são barrados para recursos milionários do Ministério da Educação (MEC).
O PME planeja as políticas públicas municipais para o ensino pelos próximos dez anos, estipulando gastos, indicadores, metas e ações. Ele é uma exigência do Plano Nacional de Educação, que vigora no país desde 2014.
Ribeirão Preto foi vanguarda ao iniciar suas discussões em 2007, mas as gestões Dárcy Vera (2009-2016) e Duarte Nogueira (2017-atual) foram incapazes de chegar a um consenso entre Executivo, Legislativo e sociedade. Assim, um PNE nunca chegou a ser transformado em lei, algo que outras 5.567 prefeituras tiveram êxito.
“Além de ser dever legal desde 2016, o PME é fundamental para dar um norte que vá além da visão imediatista do secretário ou prefeito de plantão. Sem planejamento de longo prazo, não há qualidade de gestão”, resume José Marcelino de Rezende Pinto, professor da USP-RP e ex-presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (leia entrevista no final da reportagem).
Por não ter PME, Ribeirão Preto está proibido de pleitear recursos do PAR (Plano de Ações Articuladas), um programa do MEC para financiar, com verbas suplementares, ações de melhoria na educação. A informação foi confirmada ao Farolete pelo Governo Federal, por meio da Lei de Acesso à Informação.
No ano passado, o MEC repassou R$ 760 milhões para municípios brasileiros que cadastraram projetos no âmbito do PAR, sendo 60 do estado de São Paulo. A capital paulista recebeu R$ 3,5 milhões.
A minúscula Ubirajara, com menos de 5 mil habitantes, ficou com R$ 642 mil.
Os dados foram analisados pelo Farolete na plataforma de execução orçamentária do MEC. O Governo Federal informou, em resposta à Lei de Acesso, não ser possível estipular quanto Ribeirão Preto já deixou de receber, pois as verbas são definidas de acordo com os projetos cadastrados.
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