Vereadores propõem paridade de gênero nas homenagens após Farolete escancarar abismo
Levantamento da reportagem revelou que 9 em cada 10 homenagens da Câmara de Ribeirão Preto vão para homens
Um projeto de resolução protocolado por Marcos Papa (Podemos), e assinado por outros sete vereadores, institui a paridade de gênero nas homenagens concedidas pela Câmara de Ribeirão Preto. A proposta é consequência da reportagem do Farolete, publicada na semana passada, que revelou o abismo entre homens e mulheres nas honrarias.
Levantamento do Farolete apontou que nos últimos 24 anos os vereadores protocolaram 912 projetos para títulos de cidadania ribeirão-pretana, cidadão emérito ou ordem do mérito. Desses, apenas 108 prestigiaram mulheres. Ou seja: nove em cada dez homenagens contemplaram homens.
“Com absoluta certeza há mulheres a serem homenageadas e receberem honrarias deste Parlamento, na mesma medida que os homens”, cita Papa no projeto de resolução para mudança do Regimento Interno, trazendo a transcrição de trechos da reportagem do Farolete.
Além de Papa, assinam a proposta Duda Hidalgo (PT), Gláucia Berenice (Republicanos), Ramon Faustino (PSOL), Franco Ferro (PRTB), França (PSB), Brando Veiga (Republicanos) e Coletivo Popular Judeti Zilli (PT).
“Infelizmente ainda é preciso criar mecanismos de ações afirmativas para garantir a representatividade paritária nos espaços de poder”, lamentou Judeti ao Farolete.
Ela aponta que o abismo de gênero nas homenagens é “um caso explícito do quanto na sociedade patriarcal a tendência estrutural de não valorizar ações realizadas por mulheres é uma constância, faz parte de um projeto de apagamento e invisibilidade presente fortemente nas instituições”.
O projeto de resolução passou a tramitar em 7 de julho. Não há previsão de quando será colocado em pauta para ser votado pelos demais vereadores.
O presidente da Câmara, Alessandro Maraca, ressaltou ao Farolete que o Legislativo “precisa cada vez mais destacar e reconhecer as mulheres em nossa sociedade”, e que “se não fosse o machismo estrutural as homenagens seriam em maior número”.
Entretanto, ele argumenta que a Câmara “gradativamente está mudando essa concepção”, inclusive pela maior presença de vereadoras. Na legislatura anterior havia uma mulher dentre as 27 cadeiras, na atual são 3 entre os 22 parlamentares. “Ainda estamos longe do equilíbrio, mas há avanços”.
Maraca discorda que a imposição de paridade de gênero, mediante mudança regimental, seja o melhor caminho.
“A reportagem do Farolete foi excelente para alertar os vereadores do caminho. Mas a necessidade de uma lei para equilibrar isso não é o ideal. Esse equilíbrio tem que vir de forma natural. Se criar cotas para mulheres, e não fizer o mesmo para questões de raça, classe social, entre outros, ainda gerará distorções. É muito mais forte se isso se modificar de forma cultural e educacional. Mas a discussão é muito salutar”, aponta Maraca.
No levantamento das honrarias, Farolete questionou a pesquisadora Hannah Maruci Aflalo sobre a possibilidade do Legislativo instituir uma cota para a paridade de homenagens.
Muitas vezes a reprodução de estruturas está no inconsciente. Não significada que o vereador está intencionalmente querendo excluir as mulheres, mas vem sempre na cabeça dele um homem na hora de homenagear. Quando se coloca a obrigatoriedade, obriga a pessoa a repensar”,
Hannah Maruci Aflalo
A atual legislatura, iniciada em janeiro de 2021, havia protocolado homenagens para 32 homens e 4 mulheres até junho.
Entenda
Das 5.570 cidades brasileiras, apenas três não possuem um Plano Municipal de Educação (PME): Ribeirão Preto, Iaras e Vargem, todas paulistas. Sem o documento aprovado na forma de lei, algo obrigatório desde 2016, esses municípios são barrados para recursos milionários do Ministério da Educação (MEC).
O PME planeja as políticas públicas municipais para o ensino pelos próximos dez anos, estipulando gastos, indicadores, metas e ações. Ele é uma exigência do Plano Nacional de Educação, que vigora no país desde 2014.
Ribeirão Preto foi vanguarda ao iniciar suas discussões em 2007, mas as gestões Dárcy Vera (2009-2016) e Duarte Nogueira (2017-atual) foram incapazes de chegar a um consenso entre Executivo, Legislativo e sociedade. Assim, um PNE nunca chegou a ser transformado em lei, algo que outras 5.567 prefeituras tiveram êxito.
“Além de ser dever legal desde 2016, o PME é fundamental para dar um norte que vá além da visão imediatista do secretário ou prefeito de plantão. Sem planejamento de longo prazo, não há qualidade de gestão”, resume José Marcelino de Rezende Pinto, professor da USP-RP e ex-presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (leia entrevista no final da reportagem).
Barrado
Por não ter PME, Ribeirão Preto está proibido de pleitear recursos do PAR (Plano de Ações Articuladas), um programa do MEC para financiar, com verbas suplementares, ações de melhoria na educação. A informação foi confirmada ao Farolete pelo Governo Federal, por meio da Lei de Acesso à Informação.
No ano passado, o MEC repassou R$ 760 milhões para municípios brasileiros que cadastraram projetos no âmbito do PAR, sendo 60 do estado de São Paulo. A capital paulista recebeu R$ 3,5 milhões.
A minúscula Ubirajara, com menos de 5 mil habitantes, ficou com R$ 642 mil.
Os dados foram analisados pelo Farolete na plataforma de execução orçamentária do MEC. O Governo Federal informou, em resposta à Lei de Acesso, não ser possível estipular quanto Ribeirão Preto já deixou de receber, pois as verbas são definidas de acordo com os projetos cadastrados.
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